Senta que lá vem a história.
Então, alguns de vocês sabem, mas topei fazer a figuração da minissérie "Maísa", a convite daquela mulher da Bauernfest. Sabia que seria um dia difícil e interessante, então fiz um diário, anotando mentalmente o que ia me acontecendo*. Roda o vt.
06:30 - Chego ao Quitandinha. Já tem uma galeura esperando lá numa friaca da moléstia. Não conheço uma só alma.
07:06 - Só vejo gente chegando, e até agora naaada de acontecer. Tem um monte de véinha aqui, devia ter trazido a vóvis.
07:34 - Enfim, o povo da produção aparece: produtor cara do Topo Gigio (mas pegável) manda o povo se alinhar pra avaliar o "material". Minha outra encarnação Escrava Isaura tem um dejà vu.
07:36 - Três coroas com cara de paraíba e uma loira oxigenada piranhona são descartadas. Aparentemente, não havia nordestinos e periguetes na década de 60. Climão.
07:45 - Fila do lanche: dois sanduíches de pão de forma, um pacote de biscoito recheado borogodó, um amendoim jãoponês e um refrigerante. Galera se senta no chão daquele salão mais feio - que não é o teatro mecanizado, nem o salão azul - e começam as primeiras panelinhas - véias de um lado, jovens do outro.
08:14 - Começa a chamada pra troca de roupa. Quem é a primeira? Aquela que tava bisbilhotando o camarim, eu.
08:15 - Meu vestido é o mais feio do mundo. No meio de 696846 vestidos, eu consegui que me escolhessem o mais horroroso. Sapato idem. Bijus são interessantes.
08:47 - Hora do cabelo e da maquiagem. São cinco cabeleireiros e três maquiadores, que têm na parede uns cartazes com exemplos de looks dos anos 40, 50 e 60. Cabeleireira #3 dá aquela desfiada a la Fran Fine no meu cabelo, que fica aquele capacete. Hairspray. Na maquiagem, muito pó (tv digital né, ném) e olho gatinho. Olho no espelho, tô A CARA da vóvis quando jovem. Juro que, se ela me visse desse jeito, tinha chorado de emoção. Devia ter vindo com ela.
09:15 - Na fila da maquiagem, encontro uma menina com um vestido parecido com o meu. Rola uma identificação. Já tenho com quem conversar: fiz uma amiguinha! :)
10:06 - Gente, a Kátia tem a minha idade (22), parece que tem 17, já é casada há 4 anos e tem uma filha de 3! Sempre. Fico. Bolada.
10:28 - Tudo pronto, hora de dar uns conferes nos bofes. Claro que a situação os favorece, já que estão todos de smoking e impecavelmente empertigados, mas acabam se destacando dois: o "Loiro 2 Metros" e o "Javier Barden dos Pobres". Os outros não são maus, que se diga de passagem. Há, tem também, claro, o produtor bonitinho de cabelo cacheado que parece um molequinho. Tamos bem.
11:13 - Gente, acabei de desvendar um mistério do universo: descobri como piriguete ganha dinheiro. Fazendo figuração! Uma atrás da outra, elas não param de chegar do inferno.
11:36 - Momento invejinha: única hora do dia em que eu gostaria de ter cabelo comprido. As periguetes tão saindo cada uma com um penteado mais escândalo que o outro. Elas, claro, acham tudo muito cafona. Típico.
12:00 - Já tô com fome. E nem sinal de começar. Devia ter trazido um livro.
12:25 - Produtor bonitinho diz que vai separar 10 homens e 10 mulheres pra fazer alguma coisa, entendi lhufas. Só sei que, inexplicavelmente, eu e Kátia tamos nesse grupo. Berenice, segura.
13:01 - Essa mulherada é foda. Já tá tudo sem os sapatos, com os cabelos despencando e com os vestidos levantados. Gente mais sem classe.
13:27 - Nessas horas que máquina fotográfica faz falta. Eu com uma aqui, tinha tirado fotos incríveis.
14:00 - Finalmente! Saiu o almoço. Saladinha, estrogonofe de frango, arroz, batata palha, e doce de leite de sobremesa. Jóia. Equipe come num salão, figurantes no outro. Rapazinho que serve também é caticinho (tô muito benevolente hoje).
15:00 - Reportando de hora em hora porque simplesmente essa porra não começa. Tô puta.
16:00 - Carai, se tivesse um livro, já tinha terminado de ler to-di-nho.
16:30 - Ai, chamaram a gente, enfim. Esse pessoal tem que aprender que ócio não é bom: enquanto a gente esperava, já tinha gente querendo sindicalizar os figurantes. Mais um pouco e tava tendo piquete nos bastidores.
16:35 - Gente, o Jayme Monjardim e a namorada Tânia Mara passaram por mim! Que emoção! (Not)
16:56 - Momento invejinha 2: enquanto a gente se acomoda e o povo da técnica acerta a luz, Jayme Monjardim dá entervista a umas três jornalistas, cada uma com seu gravadorzinho. Voltei à realidade por alguns minutos.
17:04 - Alguém chama o produtor bonitinho de Jaiminho. Opa, é o filho do diretor. Olá, filho do diretor...
17:20 - Chega a menina que faz a Maísa, com uma roupa enorme cor-de-rosa. Ela é idêntica a mulé, incrível. Um cara que trabalha na produção e que é evangélico diz que ela tá com o encosto. Dou aquela risadinha cética por dentro.
17:31 - "Maísa" começa a dublar cantar. A bicha parece possuída mesmo. Dá medo. Vou ter pesadelos com os olhos esbugalhados dela.
18:00 - Filho do diretor bonitinho diz o que as 20 pessoas selecionadas vão fazer: vão ficar na primeira fila da platéia, que estaria assistindo a um show de Maísa no Olimpia, em Paris. Ou seja, fui escolhida porque tenho cara de parisiense de primeria fila, mesmo com o vestido mais feio do universo. Tá boa?
18:01 - Adinvinha? Tô na primeira fila, de um lado, o loiro 2m, do outro, Javier dos pobres. Tá melhorando pro meu lado.
18:24 - Vão gravar 6 vezes a mesma coisa: Maísa cantando "Ne Me Quite Pas". De vários ângulos, com várias câmeras. Bocejos.
19:00 - Jayme Monjardim faz contato visual. Tento manter, mas não consigo e desvio o olhar. Larica, me ensina como fas.
19:16 - Gente, o maquiador da Maísa é o Torquato! Ele tá aqui dando umas pinceladas nela agora. Não é o máximo? (Not)
19:25 - Essa gravação não acaba e tá me dando nos nervos. Pelo menos tenho os bofes pra me distrair. Loiro 2m nem dá idéia, mas Javier dos pobres é mais conversador.
19:35 - Ne Me Quite Pas pela 5 vez. Loiro 2m só sabe me dar as horas, enquanto eu faço cara de enfado. Mas ainda tem Javier dos Pobres. Minha missão é descobrir o porquê da criatura estar ali, nessa posição ridícula que eu também estou. Enquanto isso, a atriz que faz Maísa faz a mesma cara de maluca pela milionésima vez.
20:05 - 30 minutos de silêncio completo. Ninguém fala uma palavra. Eu não sei puxar conversa. Alguém, me ensina como fas.
20:45 - Meo, namoral, foda-se os dois, num quero mais saber de nada, só quero ir embora. Não aguento mais, minha coluna tá doída de tando ficar sentada na mesma posição, por causa da continuidade, que de cu é rola. Ainda bem que minha vó não veio, senão ela já tinha internamente mandado tudo à merda e já saído exigindo um segundo lanche.
21:15 - Jeyme Lero-lero encerra os trabalhos e agradece a nossa paciência. Depois da gente ouvir a mesma música 154 vezes e de esperar cada centímetro do chão ser limpo por um esfregão e que "nunca tava bom", obrigado porra nenhuma, tô aqui pelo cachê. Produtor bonitinho também agradece e pergunta quem pode vir amanhã. Viro pra Kátia e faço aquela cara de cu discreta (vai que o Jayme vê, né?)
21:30 - Roupas trocadas, Kátia pede pra que eu ligue pra ela caso eu vá amanhã, porque ela bem gostaria de uma companhia. Mas ela também não tá muito animada. E eu, bom, eu tô doidinha pra ir lá de novo. (Not)
Terminei a noite de jeans, camiseta, cabelo capacete e maquiagem sessentinha caminhando de volta pra casa com mais uma experiência antropológica no currículo. Aconselho que, quem puder, passe pelo mesmo, porque por mais que neguim te fale que essas paradas são dureza, você só acredi-tá.. vendo.
Para ler lendo - Maísa: Diário de Produção.
*Passagens podem ter sido suprimidas ou alteradas. E olha que eu nem bebi.
quinta-feira, 11 de setembro de 2008
Diário de uma figurante
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